26 de janeiro de 2012

PANCREATITE Aguda

A pancreatite aguda (PA) é, na maioria dos casos, uma doença inflamatória que se resolve com medidas clínicas. Todavia, a presença de necrose pancreática e peripancreática, associada à infecção, é potencialmente grave e pode demandar cuidados e abordagens especializadas. 

A incidência de PA, baseada em registros hospitalares, varia de 5,4 a 79,8 casos por 100.000 habitantes, respectivamente, na Inglaterra e nos Estados Unidos da América. A avaliação da incidência da PA é prejudicada pela falta de confirmação histológica na maioria dos casos e, possivelmente, reflete a organização dos serviços de saúde. É provável que muitos pacientes com PA na forma branda não procurem os serviços de saúde ou, quando o fazem, os casos não são diagnosticados ou notificados 

A mortalidade global, na PA, varia de 10 a 15%. Dentre os óbitos, cerca de 50% ocorrem na fase precoce, isto é, nos primeiros 14 dias da admissão, e decorrem, principalmente, da síndrome da resposta inflamatória sistêmica, secundária à necrose pancreática, enquanto os óbitos remanescentes ocorrem na fase tardia, em função de complicações infecciosas, também da necrose pancreática.


A PA é uma doença associada ou determinada por problemas congênitos, hereditários e adquiridos, ou por agentes de natureza química, traumática e infecto-parasitária e, embora comporte diversos mecanismos etiopatogênicos, o evento final é a ativação das enzimas pancreáticas no interior das células acinares.

A magnitude das lesões pancreáticas, geralmente, correlaciona-se com a gravidade da doença, e é possível, nos dois primeiros dias da admissão, com base na apresentação clínica, na avaliação laboratorial de rotina e no exame tomográfico, classificar a doença em branda ou grave. Na forma branda, que inclui a grande maioria dos casos, as manifestações cursam com mínima repercussão sistêmica, que melhora com a reposição de líquidos e eletrólitos. O tratamento é eficaz e a doença resolve-se em, aproximadamente, uma semana.

A PA é o 5º diagnóstico etiológico de abdómen agudo mais registrado nas salas de urgência de hospitais de referência e a 4ª causa de internamento por abdómen agudo.
As principais causas de PA, são a passagem de cálculo pelo ducto biliar comum e o excesso de ingestão alcoólica, que, juntos, correspondem a aproximadamente 80% dos casos.


  • Apresentação Clínica:

O sintoma inicial, e predominante, é a dor, embora, eventualmente, possa estar ausente. O aparecimento é repentino, a localização é epigástrica, com irradiação para flancos e dorso. A dor é constante, pode ser intensa e precipitada por ingestão excessiva de álcool ou alimentos. A melhora pode ser obtida com decúbito lateral e a flexão das coxas sobre o abdômen.

As náuseas e os vômitos são freqüentes e precoces. Os vômitos podem ser de natureza reflexa ou por compressão duodenal pelo pâncreas edemaciado. Às vezes, ocorre paragem de eliminação de gases e fezes e, ocasionalmente, dispnéia. A PA indolor é rara; nessa apresentação, o prognóstico é grave, visto que os pacientes, frequentemente, estão em choque circulatório ou coma. Em alguns casos graves e fatais, a PA é diagnosticada apenas durante a necrópsia.

  • Quadro Laboratorial:

O hemograma, o ionograma, a uréia, a creatinina, a glicemia e a gasometria servem para diagnosticar alterações metabólicas e orientar as respectivas correções. Na avaliação hematológica, observa-se, com frequência, elevação do hematócrito, na admissão em virtude do sequestro e perda de líquidos.

A leucocitose é frequente, nas pancreatites graves, pode ocorrer reação leucemóide, mesmo na ausência de infecção. A hiperglicemia leve e transitória é frequente, sobretudo durante os ataques iniciais, onde a liberação de glucagon, de catecolaminas e de glicocorticóides é maior; entretanto, a persistência de hiperglicemia de jejum, superior a 200mg/dl pode refletir a instalação de necrose pancreática. A hipocalcemia pode ser notada por volta do 2° ou do 3° dia da instalação da doença e, raramente, é grave. Níveis de cálcio inferiores a 7,0 mg/dl indicam prognóstico grave. 

Em geral, as grandes elevações dos níveis de enzimas, produzidas no pâncreas, não se correlacionam com a gravidade da PA. A elevação da amilase resulta do aumento do extravasamento da enzima na circulação e da redução do clareamento renal. Após o início da inflamação pancreática, já nas primeiras horas, a amilase e a lipase sérica elevam-se. Após o ataque, a amilase sérica reduz-se mais rapidamente que a lipase, e retorna à normalidade dentro de 24 h; a elevação persistente da amilase é indício de complicação, como abscesso ou pseudocisto.

Em alguns pacientes, em que a pancreatite é letal, a amilase pode estar normal, provavelmente, pela grande destruição glandular. A lipase é o melhor indicador de pancreatite em pacientes que são vistos vários dias após o início da crise pancreática. A amilase, também, pode ser detectada nos derrames pleurais e peritoneais pancreáticos, o que pode ser de grande valia. Em geral, nesses derrames, o nível varia de 3 a 10 vezes a mais que os valores séricos, obtidos simultaneamente.

Na PA de etiologia biliar, os testes bioquímicos podem refletir o caráter intermitente ou mantido da obstrução biliar e orientar a terapêutica. A presença de cálculo, na via biliar comum, é acompanhada de elevação da bilirrubina, da fosfatase alcalina e de marcadores da lesão hepatocítica – AST e ALT. Há, também, elevação acentuada da amilase, com níveis que atingem de 2.000 a 4.000 UI/l.


  • Diagnóstico por Imagem:

As radiografias de tórax e abdomen são exames importantes para excluir causas perfurativas de abdomen agudo. No entanto, uma variedade de achados radiográficos está associada à pancreatite (Tabela III). 


Estes achados radiográficos nem sempre estão presentes e apresentam baixa especificidade na PA, no entanto, a presença de Alça Sentinela (presença de alsa isolada junto à localização do pancreas) é o achado mais frequente (41% dos casos) e pode ser util no diagnóstico diferencial por radiologia convencional. Outro sinal sugestivo de pancreatite é o "Colon Cut-Off" (interrupção abrupta do colon descendente a seguir ao angulo esplénico, que ocorre em cerca de 50% dos casos).

Radiografia simples do abdómen em decúbito dorsal. A seta mostra  sinal de "Colon Cut-Off" - interrupção abrupta do colon descendente.

Scout TC do abdómen - seta mostra sinal de "Colon Cut-Off".

Radiografia simples do abdómen em decubito dorsal. As setas indicam sinal de "Colon Cut-Off". As letras C evidenciam sinal de "Alça Sentinela" e a letra S refere-se à sombra gástrica.


A ecografia (US) tem pouco valor na avaliação do pâncreas, na estratificação da PA e na detecção de necrose pancreática; a presença de gases intestinais e a obesidade são fatores limitantes para a acurácia do exame ultra-sonográfico, em comparação à tomografia.

A US é um exame para o início da avaliação da pancreatite leve e tem grande valor no exame das vias biliares: diagnóstico de cálculos, lamas biliares, dilatação das vias biliares, espessamento da parede vesicular.

A US também pode demonstrar a extensão extrapancreática da inflamação, envolvendo o espaço pararenal anterior, o mesocólon transverso e a retrocavidade dos epíplons.  A US também é útil no seguimento evolutivo de coleções e de pseudocistos. Com a utilização do Doppler, pode auxiliar no diagnóstico de complicações vasculares, tais como pseudoaneurismas e trombose venosa.


A tomografia computorizada, por sua vez, é uma técnica disponível que, apesar de ter um custo elevado (quando comparada com a radiografia e com a ecografia), é considerada a técnica de maior utilidade, não só no diagnóstico, como na avaliação do índice de gravidade, através dos critérios de Balthazar e na detecção de complicações como necrose, colecções líquidas agudas, abcessos e pseudoquistos. 
Apresenta uma sensibilidade de 92% e especificidade de 100% para a detecção de pancreatite aguda. A sua utilidade é ainda maior nos doentes que não melhoram com a terapêutica após as 48-72 horas. A semiologia observada na tomografia computorizada depende da gravidade da inflamação, sendo o contraste iodado endovenoso útil na detecção de necrose. Os achados da TC na PA podem ser divididos em alterações pancreáticas e peri-pancreáticas, de acordo com a tabela abaixo:


As alterações  morfológicas estudadas e referidas por Balthazar et all, presentes no quando anterior, podem ser determinadas sem recorrer ao uso de contraste endovenoso, no entanto, para determinação da necrose pancreática é essencial a utilização de injecção meio de contraste.

Uma pancreatite leve, com classificação de 0-2 pontos, sem necrose da glândula, é designada por pancreatite edematosa ou intersticial. Este grau de pancreatite é auto-limitado e em cerca de 80% dos casos resolve-se com facilidade e sem qualquer complicação.

Pancreatite edematosa - Captação normal de contraste; sem necrose pancreática nem colecções liquidas. Setas mostram ligeira densificação da gordura peripancreática. Classificação de 2 pontos na escala de Balthazar.

Um grau intermédio/mediano de gravidade de PA, sem necrose pancreática, com uma classificação de 3-4 pontos é designado por pancreatite exudativa. Este grau de PA apresenta mais riscos, quando comparado com o anterior, dado que aqui estão presentes colecções peripancreaticas que podem vir a infectar.

Pancreatite exudativa - Normal captação de contraste em todo o pancreas; Associam-se 2 ou mais extensas colecções peripancreáticas mas sem necrose pancreática. Classificação de 4 pontos na escala de Balthazar.

Uma pancreatite grave, acima dos 4 pontos na escala de Balthazar, envolve necrose pancreática. A detecção e determinação do grau de necrose numa PA, na prática clínica, é muito importante visto que a maior parte das complicações potencialmente fatais ocorre em doentes que apresentam necrose pancreática.


Pancreatite grave - Imagens obtidas pós contraste EV mostram hipocaptação de contraste na cauda e corpo do pancreas (setas azuis) e captação normal na cabeça da glândula (seta amarela). Assim determina-se mais de 50% de necrose e também se observam pelo menos duas colecções (10 pontos na escala de Balthazar).


  • Exemplos Clínicos (Exames TC):
 
 







22 de dezembro de 2011

Hemorragia SUBARACNOIDEA

A hemorragia subaracnóidea é um tipo ataque causado pelo rompimento de um vaso sanguíneo, que forma uma acumulação de sangue na superfície do cérebro. O sangue oriundo de uma hemorragia subaracnóidea preenche a porção de espaço que se encontra entre o próprio cérebro e a membrana aracnóidea (a membrana média que cobre o cérebro). 



Uma grande acumulação de sangue actua como uma massa que cresce e pressiona o cérebro, interferindo com o seu funcionamento. Para além de causar este efeito, a hemorragia também interrompe o fornecimento vital de sangue para uma área do cérebro que era normalmente alimentada pelo vaso rompido. 

A hemorragia no espaço subaracnóideo é na maior parte dos casos de origem arterial e, para alguns autores, principalmente provocada por ruptura de aneurisma num dos principais vasos cerebrais. Pode também ser resultado de:
  • Ruptura de um vaso;
  • Malformações arteriovenosas;
  • Traumas crânio-cerebrais;
  • Operações neurológicas;
  • Alta pressão arterial;
  • Outras anomalias vasculares.
Em situações patológicas, como na hipertensão arterial, o fluxo sanguíneo cerebral perde a capacidade de auto-regulação e passa a ser dependente da pressão sanguínea, ocasionando por vezes uma hiperperfusão cerebral com hemorragias intra-cerebrais ou acelerando a aterosclorose com obstrução das artérias cerebrais por depósitos de gordura nas suas paredes. 
Nas bifurcações das artérias cerebrais, por vezes, origina-se uma região sem camada elástica (apenas com camada adventícia) principalmente na bifurcação dos vasos do polígono de Willis e das artérias que aí se originam. Com o permanente pulsar do sangue neste ponto de parede desprotegida pode surgir uma dilatação repleta de sangue - o aneurisma. Com o passar dos anos, este aneurisma aumenta gradualmente de tamanho, principalmente se existir associada hipertensão arterial. Após um determinado tamanho, as paredes tornam-se tão frágeis que podem romper ocasionando a denominada hemorragia subaracnóidea. 
Aneurisma
Sintomas:
  • Dor de cabeça:
- Ataque súbito,
- Descrita como "a mais forte alguma vez sentida",
- Precedida de uma sensação de detonação dentro da cabeça,
- Dor descrita como sendo de um tipo desconhecido,
- Dor generalizada, geralmente pior na parte posterior da cabeça.
  • Náuseas e vómitos:
- Podem acompanhar a dor de cabeça.
  • Diminuição da consciência e vivacidade:
- Pioram temporária ou progressivamente até ao estado de coma e morte
  • Dificuldades ou alterações da visão:
- Visão duplicada dos objectos,
- Diminuição do campo de visão (cegueira parcial),
- Perda de visão temporária num olho.
  • Dificuldade ou perda de movimento ou sensibilidade numa parte do corpo.
  • Alterações de humor e personalidade:
- Confusão,
- Irritabilidade.

Outros sintomas que podem estar associados com a doença:
  • Olhos ou pupilas de tamanhos diferentes.
  • Pálpebras semicerradas.

Incidência:
 
A hemorragia subaracnóidea tem uma taxa de ocorrência de cerca de 1:10 000 indivíduos, sendo mais comum entre os 20 e os 60 anos, incidindo mais na mulher do que no homem. A frequência da doença, em ambos os sexos, aumenta linearmente com a idade e a predisposição genética parece existir em alguns casos.

Mortalidade:

Cerca de 12 % dos indivíduos atingidos pela hemorragia subaracnóidea morrem antes de receber cuidados médicos e 40 % dos doentes hospitalizados morrem no espaço de um mês contado a partir da crise inicial. De entre os sobreviventes, mais de um terço fica com deficiências neurológicas graves. Nos Estados Unidos, cerca de 10 a 15 % dos pacientes morrem antes de chegar ao hospital; a mortalidade cresce para os 40 % ao fim da primeira semana e cerca de 50 % morrem nos primeiros 6 meses. 

A mortalidade aumenta com a idade e o depende do estado de saúde geral do paciente. Os avanços no tratamento da hemorragia subaracnóidea resultaram numa redução da mortalidade relativa superior a 25 %. Contudo, mais de um terço dos sobreviventes ficam com grandes deficiências neurológicas. 


Tratamento:

O tratamento inicial da hemorragia subaracnóidea inclui descanso absoluto bem como medicação preventiva contra ataques, redução da dilatação cerebral e espasmos das artérias cerebrais. Todos os pacientes que contraem a doença por ruptura de aneurisma cerebral, devem ser mantidos nos cuidados intensivos, independentemente do seu quadro clínico. 

Por ter valor prognóstico e implicação terapêutica, os pacientes são classificados com escalas existentes. Assim, segundo a escala de Hunt & Hess:

Grau:

  1.  Quando assintomático ou com leve cefaleia.
  2.  Com moderada a severa cefaleia, rigidez de nuca ou paralisia óculomotora.
  3.  Se estiver confuso, sonolento com ou sem sinais focais leves.
  4.  Já em coma superficial com ou sem hemiparesia.
  5.  Comatoso, resposta em extensão, sinais vitais instáveis. 

Sinais e Testes:
 
Na hemorragia subaracnóidea, o exame neuromuscular indica habitualmente irritação meníngica. O pescoço pode estar rígido e o seu movimento oferece resistência excepto nos casos de coma profundo. Pode haver sinais de deficit neurológico localizado (perdas localizadas da função nervo/cérebro). Um exame dos olhos pode indicar hemorragia no cérebro; também pode mostrar diminuição do movimento e alterações que indicam danos no terceiro e sexto nervos crânianos.

Diagnóstico por:
  • Exame do fluido cérebro-espinal (punção lombar) que contenha indícios de sangue.
  • Tomografia computorizada do crânio, sem contraste (o mais utilizado) ou uma MRI que mostre sangue na área subaracnóidea.
  • Angiografia dos vasos sanguíneos do cérebro (angiografia cerebral) que mostre pequenos aneurismas ou outra anomalia vascular e a localização exacta da hemorragia.

Caso Clínico:

Doente com 65 anos que apresentava forte dor de cabeça, mais intensa na região posterior, afasia e alterações do comportamento.

Exame TC CE sem contraste EV, mostra evidente hemorragia subaracnóidea:




















7 de novembro de 2011

TROMBOEMBOLISMO PUMOLNAR - TEP



Tromboembolismo pulmonar (TEP) ou Embolia Pulmonar (EP), consiste na obstrução aguda da circulação arterial pulmonar pela instalação de coágulos sanguíneos, geralmente, oriundos da circulação venosa sistêmica, com redução ou cessação do fluxo sanguíneo pulmonar para a área afetada. Essas condições inter-relacionadas constituem o tromboembolismo venoso (TEV), no qual, a trombose venosa profunda (TVP) é o evento básico e a TEP, a principal complicação aguda.
  
Os fatores de risco do TEV/TEP são aqueles que proporcionam as condições básicas de trombogênese venosa (Tríade de Virchow): estase do fluxo venoso, lesão ou inflamação endotelial e estados de hipercoagulabilidade. Alguns exemplos de condições clínicas, predisponentes ao desenvolvimento de TEV/TEP são:

Fatores Maiores de Risco (risco relativo 5 a 20)

Cirurgia:
  • Cirurgia abdominal ou pélvica
  • Prótese de joelho ou quadril
  • Necessidade pós-operatória de UTI
Obstétricos:
  • Gravidez tardia
  • Parto cesária, pré-eclampsia, multiparidade
  • Puerpério
Membros inferiores:
  • Fratura
  • Varizes
Neoplasias malignas:
  • Abdominal ou pélvica
  • Avançada ou metastática
Outros:
  • Episódio prévio de TEV
Fatores Menores de Risco (risco relativo 2 a 4)

Cardiovascular:
  • Insuficiência cardíaca congestiva
  • Doenças cardíacas congênitas
  • Hipertensão arterial sistêmica
  • Trombose venosa superficial
  • Cateter venoso central
Estrógenos:
  • Contraceptivo oral
  • Terapia de reposição hormonal
Outros:
  • DPOC
  • Incapacidades de origem neurológica
  • Tumores ocultos
  • Doenças trombóticas
  • Viagens de longa distância
  • Obesidade
  • Doença intestinal inflamatória
  • Síndrome nefrótica
  • Diálise
  • Doenças mieloproliferativas
  • Hemoglobinúria paroxística noturna
  • Doença de Behçet

Os trombos estão localizados, principalmente, no sistema venoso profundo (81%), sendo que as veias proximais dos membros inferiores (ilíacas e femorais) estão relacionadas com maior risco de TEP. As cavidades cardíacas direitas contribuem com cerca de 19% dos êmbolos, relacionando-se, principalmente, com as cardiopatias dilatadas e isquêmicas e com as arritmias.




 
Tromboembolismo pulmonar (TEP) é uma entidade clinica comum que resulta em morbidade e mortalidade em um grande número de pacientes. Diagnóstico imediato e correto é importante por causa dos riscos de complicações do TEP e do tratamento com anticoagulantes. A base do diagnóstico é a probabilidade clínica para tromboembolismo pulmonar é o uso do dímero D (quando disponível). No entanto, o diagnóstico específico requer avaliação por métodos específicos de imagem.
 
A introdução da tomografia computadorizada (TC) espiral no início dos anos 90 tornou possível avaliar todo o tórax num curto espaço de tempo, bem como analisar as artérias pulmonares durante o pico máximo de opacificação pelo meio de contraste. Vários estudos demonstraram elevada sensibilidade e especificidade da TC espiral para o diagnóstico de TEP (Remy-Jardin M, Remy J, Deschildre F. Diagnosis of pulmonary embolism with spiral CT: Comparison with pulmonary angiography and scintigraphy. Radiology 1996; 200: 699-706.)
 
A acurácia da TC aumentou ainda mais com o recente advento dos equipamentos de TC espiral com multidetectores que permitem uma melhor avaliação das artérias pulmonares segmentares e subsegmentares. Em diversos centros por tudo o mundo, a TC espiral tornou-se a modalidade de escolha para o diagnóstico de TEP.
 
Os achados característicos de TEP agudo são:
  1. Defeito de enchimento parcial central ou periférico circundado por um pequeno halo de contraste;  
  2. Completo defeito de enchimento com obliteração de todo o vaso avaliado.
Num evento de TEP agudo, as artérias pulmonares quando completamente obstruídas geralmente têm diâmetro aumentado.
 
Possíveis problemas relacionados à técnica, anatomia e à colaboração do paciente podem levar à falsa interpretação nas imagens de TC. Problemas técnicos ocorrem em 1 a 5% dos exames, e na grande maioria são decorrentes de artefatos de movimento em pacientes dispnéicos ou de opacificação inadequada dos vasos pelo meio de contraste.
 
Os relatos da acurácia diagnóstica da TC espiral têm variado de acordo com a técnica utilizada e da população de pacientes avaliados. De modo geral, esses estudos têm mostrado uma sensibilidade de 90%, especificidade de 90%, valor preditivo positivo de 93% e valor preditivo negativo de 94% para TC espiral na avaliação de tromboembolismo pulmonar agudo. 
 
Segue em baixo imagens de Angio-TC compativeis com TEP central envolvendo o ramo direito da artéria pulmonar, com um trombo extenso de cerca de 70mm de extensão longitudinal, desde a bifurcação, que se torna oclusivo no inicio da divisão segmentar desta artéria. TEP à esquerda com envolvimento parcial das divisões segmentares do lobo inferior.






 

13 de setembro de 2011

COLECISTITE


A colecistite é uma inflamação da vesícula biliar, um pequeno órgão em forma de saco, localizado no quadrante superior direito do abdómen, sob o lobo direito do fígado.

Em condições normais, a vesícula funciona como um reservatório de bílis, um líquido produzido pelo fígado, que contem enzimas que digerem as gorduras. Durante uma refeição, a bílis passa da vesícula para um canal de excreção, sendo então conduzida até ao intestino, mais concretamente ao duodeno, onde vai então participar na digestão.


Esquema anatómico


A colecistite desenvolve-se, geralmente (95% dos casos), quando um individuo tem litíase vesicular, isto é, cálculos biliares (“pedras na vesícula”), que são depósitos que se formam no interior da vesícula a partir do colesterol ou dos pigmentos biliares existentes na bílis. Se um dos cálculos sai da vesícula e provoca a obstrução do seu canal excretor, a bílis fica aprisionada no interior da vesícula, o que vai levar à inflamação da parede, seja por acção directa dos químicos existentes na bílis, seja porque a estase favorece a infecção bacteriana, constituindo-se assim a colecistite.


Representação esquemática de litíase biliar com obstrução do sistema excretor.


Um bloqueio súbito da excreção da bílis com infecção dá origem a uma colecistite aguda, contudo, se ocorrerem ataques ligeiros, repetidos, de colecistite aguda, pode-se desenvolver uma colecistite crónica, que se caracteriza por uma vesícula com parede espessada e retraída em virtude dos múltiplos episódios de inflamação e irritação da parede. Eventualmente, numa fase mais avançada, a vesícula pode estar tão retraída que perde a capacidade de armazenar e libertar a bílis.

Os cálculos biliares podem, por si só, sem que haja inflamação, causar dor recorrente devido a uma obstrução intermitente, o que é denominado cólica biliar.


ACHADOS EM TC: 
  1. Distensão da Visicula Biliar; 
  2. Espessamento da parede da Visicula;  
  3. Hiperdensidade da mucosa (> 20 UH);  
  4. Densificação ou presença de fluido perivesicular; 
  5. Litíase vesicular (65-75% dos cálculos apresentam uma densidade visível). 

A visicula biliar considera-se distendida quando mede mais de 5 cm (eixo menor) e mais de 8 cm no seu maior eixo. A sua parede encontra-se espessada se a sua medida for superior a 4 mm, isto se a vesícula não se encontar colapsada (o que ocorre quando o seu eixo menor é inferior a 2 cm).

É de salientar que o espessamento difuso da parede da visícula, por si só, é um sinal pouco específico de colecistite, uma vez que este pode estar associado a outras efermidades como ascite, hepatite e outros processos inflamatórios noutros orgãos abdominais como, por exemplo, na pancreatite. Num estudo de Zissin et all, 2006, realizado a 21 individuos com pielonefrite aguda, 19 apresentavam espessamento difuso da visícula biliar.
 
Parede da visícula biliar normal, pós contraste.

Espessamento difuso da parede da visícula devido a edema subseroso.

Colecistite aguda em individuo de 84 anos que se apresentava nauseado, com vómitos e dor epigastrica difusa. A imagem axial, pós contraste, mostra litíase vesicular, espessamento da parede da vesícula, hiperdensidade da mucosa e densificação da gordura perivesicular.

Colecistite aguda em individuo com 67 anos. No exame clínico apresentava Murphy positivo e dor no flanco Drt. A imagem axial, pós contraste, mostra espessamento e distensão visicular (12,5 com de maior eixo) e densificação da gordura perivisicular.

Espessamento difuso da parede da visícula em mulher de 27 anos com Pielonefrite aguda. A imagem mostra nefrograma esteriado no Rim Esq
 

1 de setembro de 2011

INCIDENTALOMAS da Supra-Renal


As massas da supra-renal detectadas de forma acidental no decorrer de um exame imagiológico são designadas por incidentalomas. A sua abordagem clínica é controversa. O objectivo fundamental é tentar estabelecer, se a massa apresenta secreção hormonal ou tem dimensões e características imagiológicas suspeitas de malignidade, o que implicaria tratamento cirúrgico. No entanto a maioria das massas da supra-renal são completamente inócuas e portanto podem ser apenas vigiadas.


Esquema da localização da Adrenal ou Supra-Renal.

Esquema da estrutura da glândula Supra-Renal.
 
Descritos pela primeira vez há mais de 20 anos, os incidentalomas da supra-renal tornaram-se achados frequentes na prática médica, pelo que, a abordagem correcta desta patologia é essencial. Fundamentalmente deve-se determinar se a lesão é funcionante ou não, e se é benigna ou maligna, de forma a orientar a terapêutica para a excisão cirúrgica ou tratamento conservador.


Supra-Renal normal.

Massa da Supra-Renal.


  • Prevalência:
A utilização de tecnologia de alta resolução na TC permite obter uma prevalência elevada de incidentalomas, muito semelhante à obtida em autópsia . O pico da incidência é entre a 5ª e 7ª década de vida com a idade média de diagnóstico aos 55 anos.

Os achados são ligeiramente superiores, em numero, nas mulheres do que nos homens. As massas da glândula adrenal são diagnosticadas à direita em 50 a 60% dos casos, à esquerda em 30 a 40% dos casos e bilateralmente em 10 a 15% dos casos. Estas diferenças resultam da realização de ecografias abdominais onde o diagnóstico de massas da supra-renal é mais fácil à direita, pois as séries obtidas por autópsia e com uso exclusivo da TC têm uma distribuição semelhante, em ambos os lados.

O diâmetro médio das massas da glândula adrenal determinado por TAC é de 3 a 3,5 cm. Habitualmente a TC subestima a dimensão destas massas na ordem dos 20 a 47% relativamente ao exame anatomopatológico. Este é um facto a ter em conta na medida que existe uma relação estreita entre a dimensão das massas e a probabilidade destas serem malignas.

  • Etiologia:

As massas da supra-renal diagnosticadas de forma acidental podem ser benignas ou malignas e podem ter origem no cortéx ou na medula da supra-renal. Os Adenomas do cortéx da supra-renal são o diagnóstico anatomopatológico mais frequente nos incidentalomas. A sua prevalência é de cerca de 52% (Figura 1). Estas são lesões benignas sem evidência de degeneração maligna.

Apesar da maioria dos adenomas do cortéx da supra-renal serem não funcionantes, 5-47% segregam cortisol e 1,6-3,3% segregam mineralocorticoides. Raramente massas benignas têm hipersecreção de androgénios ou estrogénios. Os tumores da medula são menos frequentes e representados maioritariamente pelos Feocromocitomas em cerca de 11% (Figura 1).


As glândulas supra-renais são um local frequente de metastização. Qualquer tumor primário pode metastizar na supra-renal. Os tumores onde mais frequentemente se verifica disseminação para a supra-renal são os do pulmão, mama, linfoma, leucemia, rim e ovário. A prevalência de matástases como massas acidentais da supra-renal é de 2%.

  • Avaliação por TC:

A maior parte das massas adrenais diagnosticadas acidentalmente são detectadas por TC. Esta é a técnica mais eficaz para o estudo da supra-renal, tendo uma sensibilidade de 100%
O córtex adrenal e a maioria dos tumores benignos da supra-renal contêm grande quantidade de lípidos intracitoplasmáticos o que não acontece com os tumores malignos. As estruturas com conteúdo lipídico têm um coeficiente de atenuação menor e portanto um valor baixo de UH. Assim na TC sem contraste a densidade dos adenomas é na ordem dos 0 a 30UH. No entanto para o diagnóstico de adenoma com melhor sensibilidade (71%) e especificidade (98%) deverão considerar-se valores de densidade menores que 10 UH.


TC abdominal: Incidentaloma da SR esq. com densidade = 1.334 UH. Adenoma.

Imagem Coronal, pós contraste. Adenomas em ambas as SR.

Salienta-se que cerca de 10-40% dos adenomas não são ricos em lípidos pelo que o seu valor de densidade médio é relativamente maior. Assim nem todos os adenomas podem ser devidamente caracterizados utilizando exclusivamente a TC sem contraste.

Na TC com contraste os adenomas têm a particularidade de uma rápida captação e eliminação do contraste (washout). Este padrão mantém-se mesmo nos adenomas pobres em lípidos. Quando o valor da eliminação de contraste é maior que 50% existe uma elevada probabilidade da existência de uma massa benigna. 






Em suma, na TC os adenomas da supra-renal aparecem como:
  • Massas pequenas
  • Homogéneas,
  • Margens bem definidas,
  • Valores de densidade baixos,
  • Rápida eliminação de contraste


Os adrenocarcinomas são habitualmente massas de grandes dimensões, densas e heterogéneas. A eliminação de contraste é lenta. É frequente a existência de necrose central e calcificações nestas massas. Por vezes evidencia-se invasão de estruturas anexas como o rim e veia cava.

As metástases da glândula supra-renal podem variar de dimensões microscópicas até massas de grandes dimensões. As metástases pequenas podem ter aspecto homogéneo e com limites mal definidos e as de grandes dimensões aspecto irregular e heterogéneo. Os valores de densidade podem por vezes ser sobreponíveis aos dos adenomas. No entanto a eliminação do contraste é lento nestas lesões.

Os feocromocitomas são massas ovais ou arredondadas com um diâmetro médio de cerca de 2 a 5 centímetroshipervascularização têm uma elevada captação de contraste e um aspecto heterogéneo.

23 de agosto de 2011

ESTEATOSE Hepática


A infiltração gordurosa hepática (IGH) ou esteatose hepática (EH) é uma entidade que resulta do depósito de triglicéridos nos hepatócidos, ou seja, a EH é caracterizada pelo acumulo de gordura no fígado. Esta infiltração gordurosa no fígado, apesar de geralmente assintomática, não é totalmente benigna, uma vez que, em muitos indivíduos, além do excesso de gordura, desenvolvem alterações necro-inflamatórias e apresentam evidencia de dano hepatocelular, normalmente designado por esteatohepatite não alcoólica (EHNA), sendo que, 20% dos casos evolui para cirrose no espaço de 5 a 10 anos.
O desenvolvimento da EH está associado a uma variedade de factores predisponentes incluindo o abuso do álcool, obesidade, agressão de toxicidade medicamentosa (quimioterapia), diabetes, gestação, entre outros menos relevantes. 
 
 
Os indivíduos que apresentam EH são, em geral, assintomáticos, embora em alguns casos a hepatomegalia que pode evoluir como resultado da EH possa dar origem a dor e mau estar abdominal, enfartamento e sensação de saciedade. Raramente os indivíduos com EH apresentam alterações laboratoriais, apesar de uma pequena percentagem poder apresentar alterações das enzimas hepáticas.
  • Estudo por TC:
A tomografia computadorizada é um método não invasivo capaz de detectar a infiltração gordurosa hepática, focal ou difusa, de forma eficaz. O valor de atenuação do fígado normal é de 45 a 70 UH e é, geralmente 8 a 10 UH maior do que o valor de atenuação do baço, em tomografia sem contraste. 
Se existe uma infiltração gordurosa no fígado, a tomografia irá mostrar uma diminuição da atenuação do parênquima hepático. Isto pode ser determinado usando como referência os valores de atenuação do baço. Assim sendo, pode-se afirmar que existe EH quando a atenuação do fígado é igual ou menor 10 UH que a atenuação do baço. 
Outra relação que pode ser utilizada para a determinação de EH é o valor de atenuação do fígado sobre a atenuação do baço. Quando este valor é menor ou igual a 0.9 estamos perante um padrão esteatótico, e se este valor for igual ou inferior a 0.5 pode-se considerar uma esteatose moderada a severa.
A EH focal pode, por vezes, simular outras patologias. Embora esta seja na sua maioria dos casos difusa, a EH focal é caracterizada por uma distribuição desigual da deposição de gordura no parênquima hepático e poderá gerar , em TC, uma ou mais áreas focais de menor atenuação que o retante figado e assim, colocar em divida o seu diagnóstico. O local mais comum de aparecimento de EH focal é junto ao Ligamento Falciforme.
 
Hepatomegalia esteatótica difusa, em doente que realiza quimioterapia.

Valores de densidade (UH) B: Figado; C: Baço




Esteatose hepática grave.

Valores da densidade (UH) A: Figado; B: Baço